Greve, greve, greve – em minha defesa, em defesa de meus colegas.
Acabo de receber uma belíssima crônica de uma colega que também está em greve - esta greve mais bonita do mundo!!! -, a professora Mara Silveira, que fala sobre a nossa luta, analisando com poesia os dilemas que enfrentamos. Nesta longa e histórica aula de cidadania que se tornou a nossa greve. Eis o texto da Mara, que transcrevemos a seguir:
" Greve, greve, greve – em minha defesa, em defesa de meus colegas.
Me senti motivada a escrever esse texto depois que li um e-mail de um professor que é contra o movimento grevista.Eu acredito e sei que o direito de greve é individual e que a opinião a respeito gera muita polêmica e divergências.Ouvi por ai, frases de apoio e desapoio.Parece que estamos em guerra entre nós mesmos.
Pensei muito sobre o ditado que diz que “por causa dos ruins os bons sempre levam”.
Quem são os “ruins” nessa história? Depende do ponto de vista. Talvez para alguns, nós grevistas sejamos os ruins, talvez os não corajosos e não confiantes na causa sejam os ruins, ou nossos governantes são os ruins? Ou ruim é nossa classe que não se une integralmente para que o governo tenha necessidade de tomar uma decisão rápida?
No e-mail do colega que li, ele se põe em defesa dos alunos que são os maiores prejudicados nessa história toda. Concordo. Mas quem são os ruins nesse caso? Nós, professores que estamos lutando por nossos direitos? Dando-lhes exemplos de cidadania? Que os aconselhamos dentro de sala de aula a lutar também e não ser apático e parado diante da vida? Ou o governo, a política forte do nosso estado que acha que por estarmos desunidos, acha que pode nos enrolar com propostas descabidas e consequentemente adiando com o término do movimento?
Penso no depoimento de uma mãe que foi em uma de nossas assembléias que veio de mudança do sul de Brasil, e chegando aqui, deu de cara com a greve. Ela nos disse que o movimento no sul dura uma semana. Uma semana! E o governo já negocia. E o nosso governo?Por quanto tempo ficou em silêncio?
Parece mesmo uma grande guerra ou uma grande aventura esse momento de greve. Ao analisar e refletir sobre tudo isso me veio à mente os povos portugueses, que no passado, foram corajosos, ousados ao saírem em busca de novas terras. Eles eram antropocêntricos, acreditavam na mitologia grega, em monstros marinhos e mesmo diante de tal crença, construíram suas embarcações, mesmo sem saber se os monstros os iam matar, quantos dias iam navegar se iriam ficar doentes, se a comida que levavam ia dar para os dias de viagem que eles nem sabiam quantos seriam. E qual foi à conseqüência imediata disso? Aí me vem à mente o grande poeta Fernando Pessoa quando escreveu o poema Mar Português. Conseqüências imediatas das aventuras dos portugueses: “Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar!”
Quem foram os ruins nessa parte da história? Os noivos, os filhos que foram corajosos em ir se aventurar e fizeram seus entes queridos sofrer?
Eu, como professora grevista tenho a real convicção que meu aluno é o prejudicado. Sem a menor dúvida disso. Mas meu aluno é jovem. Se ele for fazer um vestibular agora, e for inteligente e esforçado, mesmo que ele tenha que estudar sozinho ele não vai deixar que a greve o prejudique. Se prejudicar, ele é jovem, tem outra chance no próximo ano. Prefiro pensar assim. E meu aluno de terceiro ano que vai fazer um concurso da PM, entrar para a corporação com 19 anos e iniciar sua carreira ganhando um salário melhor que uma professora que foi minha professora e está na sala de aula há 25 anos ganhando um mísero salário. Eu e ela temos que lutar por um salário justo e digno. Temos esse direito. Uns dizem por aí que se não estamos satisfeitos com nossa profissão, temos que mudar. Mudar? Não quero mudar de profissão. Quero lutar por ela! Mesmo consciente que essa luta prejudica diretamente meus alunos. E mais uma vez penso no Poeta:
“Vale a pena? Tudo Vale a pena se a alma não é pequena.”
Qual é o valor do meu trabalho? Se formos fazer uma pesquisa de médicos dermatologistas, por exemplo, ao ligarmos nos consultórios, veremos que cada médico põe seu preço em sua consulta. Uns vão cobrar 90 reais, outros 120 reais, outros 150 reais. É natural acharmos que o melhor médico é o que cobra mais caro. E o melhor professor cobra quanto? 5 reais, 6 reais, 7 reais por cinquenta minutos de aula para atender trinta, quarenta alunos ao mesmo tempo? Somente isso que vale nosso trabalho? De repente até mais para professores que tem seus cargos garantidos na rede pública Municipal ou na rede Particular. O salário do estado vira um complemento. Mas e os professores que são arrimo de família e precisam de seus salários do estado, vão continuar mesmo a vender seus cinquenta minutos de aula por esse mísero valor? Nós estudamos tanto quanto qualquer profissional de qualquer profissão. Fazemos especialização, e temos que aceitar o valor que o governo nos impõe? Estávamos adormecidos. Acordamos. Nem todos acordaram infelizmente. Conquista? Só com sacrifício. “Quem quere passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.”
A conseqüência final para os povos portugueses que se mantiveram vivos até o fim foi poder, Portugal se tornou um dos países mais ricos do mundo. Não queremos riqueza. Queremos um salário justo, digno. Queremos que o governo de Minas cumpra com o que está na lei estadual e federal.
Estamos nos sacrificando e sacrificando nossos alunos, talvez sendo antropocêntricos, não pensando, por exemplo, que muitos dos alunos e de nós vamos perder férias com a família. Mas não estou lutando somente pelo agora, mas pelo salário justo que anseio estar ganhando quando eu tiver meus 25 anos de sala de aula. Prefiro pensar que estou ao menos tentando ser ousada, corajosa como os povos portugueses foram e dando exemplo de luta, ousadia, coragem, cidadania para meus alunos. E vale a pena?
“Tudo Vale a pena se a alma não é pequena”
" Greve, greve, greve – em minha defesa, em defesa de meus colegas.
Me senti motivada a escrever esse texto depois que li um e-mail de um professor que é contra o movimento grevista.Eu acredito e sei que o direito de greve é individual e que a opinião a respeito gera muita polêmica e divergências.Ouvi por ai, frases de apoio e desapoio.Parece que estamos em guerra entre nós mesmos.
Pensei muito sobre o ditado que diz que “por causa dos ruins os bons sempre levam”.
Quem são os “ruins” nessa história? Depende do ponto de vista. Talvez para alguns, nós grevistas sejamos os ruins, talvez os não corajosos e não confiantes na causa sejam os ruins, ou nossos governantes são os ruins? Ou ruim é nossa classe que não se une integralmente para que o governo tenha necessidade de tomar uma decisão rápida?
No e-mail do colega que li, ele se põe em defesa dos alunos que são os maiores prejudicados nessa história toda. Concordo. Mas quem são os ruins nesse caso? Nós, professores que estamos lutando por nossos direitos? Dando-lhes exemplos de cidadania? Que os aconselhamos dentro de sala de aula a lutar também e não ser apático e parado diante da vida? Ou o governo, a política forte do nosso estado que acha que por estarmos desunidos, acha que pode nos enrolar com propostas descabidas e consequentemente adiando com o término do movimento?
Penso no depoimento de uma mãe que foi em uma de nossas assembléias que veio de mudança do sul de Brasil, e chegando aqui, deu de cara com a greve. Ela nos disse que o movimento no sul dura uma semana. Uma semana! E o governo já negocia. E o nosso governo?Por quanto tempo ficou em silêncio?
Parece mesmo uma grande guerra ou uma grande aventura esse momento de greve. Ao analisar e refletir sobre tudo isso me veio à mente os povos portugueses, que no passado, foram corajosos, ousados ao saírem em busca de novas terras. Eles eram antropocêntricos, acreditavam na mitologia grega, em monstros marinhos e mesmo diante de tal crença, construíram suas embarcações, mesmo sem saber se os monstros os iam matar, quantos dias iam navegar se iriam ficar doentes, se a comida que levavam ia dar para os dias de viagem que eles nem sabiam quantos seriam. E qual foi à conseqüência imediata disso? Aí me vem à mente o grande poeta Fernando Pessoa quando escreveu o poema Mar Português. Conseqüências imediatas das aventuras dos portugueses: “Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar!”
Quem foram os ruins nessa parte da história? Os noivos, os filhos que foram corajosos em ir se aventurar e fizeram seus entes queridos sofrer?
Eu, como professora grevista tenho a real convicção que meu aluno é o prejudicado. Sem a menor dúvida disso. Mas meu aluno é jovem. Se ele for fazer um vestibular agora, e for inteligente e esforçado, mesmo que ele tenha que estudar sozinho ele não vai deixar que a greve o prejudique. Se prejudicar, ele é jovem, tem outra chance no próximo ano. Prefiro pensar assim. E meu aluno de terceiro ano que vai fazer um concurso da PM, entrar para a corporação com 19 anos e iniciar sua carreira ganhando um salário melhor que uma professora que foi minha professora e está na sala de aula há 25 anos ganhando um mísero salário. Eu e ela temos que lutar por um salário justo e digno. Temos esse direito. Uns dizem por aí que se não estamos satisfeitos com nossa profissão, temos que mudar. Mudar? Não quero mudar de profissão. Quero lutar por ela! Mesmo consciente que essa luta prejudica diretamente meus alunos. E mais uma vez penso no Poeta:
“Vale a pena? Tudo Vale a pena se a alma não é pequena.”
Qual é o valor do meu trabalho? Se formos fazer uma pesquisa de médicos dermatologistas, por exemplo, ao ligarmos nos consultórios, veremos que cada médico põe seu preço em sua consulta. Uns vão cobrar 90 reais, outros 120 reais, outros 150 reais. É natural acharmos que o melhor médico é o que cobra mais caro. E o melhor professor cobra quanto? 5 reais, 6 reais, 7 reais por cinquenta minutos de aula para atender trinta, quarenta alunos ao mesmo tempo? Somente isso que vale nosso trabalho? De repente até mais para professores que tem seus cargos garantidos na rede pública Municipal ou na rede Particular. O salário do estado vira um complemento. Mas e os professores que são arrimo de família e precisam de seus salários do estado, vão continuar mesmo a vender seus cinquenta minutos de aula por esse mísero valor? Nós estudamos tanto quanto qualquer profissional de qualquer profissão. Fazemos especialização, e temos que aceitar o valor que o governo nos impõe? Estávamos adormecidos. Acordamos. Nem todos acordaram infelizmente. Conquista? Só com sacrifício. “Quem quere passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.”
A conseqüência final para os povos portugueses que se mantiveram vivos até o fim foi poder, Portugal se tornou um dos países mais ricos do mundo. Não queremos riqueza. Queremos um salário justo, digno. Queremos que o governo de Minas cumpra com o que está na lei estadual e federal.
Estamos nos sacrificando e sacrificando nossos alunos, talvez sendo antropocêntricos, não pensando, por exemplo, que muitos dos alunos e de nós vamos perder férias com a família. Mas não estou lutando somente pelo agora, mas pelo salário justo que anseio estar ganhando quando eu tiver meus 25 anos de sala de aula. Prefiro pensar que estou ao menos tentando ser ousada, corajosa como os povos portugueses foram e dando exemplo de luta, ousadia, coragem, cidadania para meus alunos. E vale a pena?
“Tudo Vale a pena se a alma não é pequena”
Mara
Professora na rede pública Estadual de MG"
Professora na rede pública Estadual de MG"
Acerca do texto da colega Mara é imprescindível ressaltar que a História, Antiga ou Moderna, comprova que grandes conquistas foram conseguidas com sacrifícios correspondentes. Sempre vale a pena lutar pelo o que é justo.
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